Por que você escreve?

Por que você escreve?

As pessoas às vezes me perguntam isso. O que a levou a escrever? Por que você gosta de escrever? E, algumas vezes, até por que insistir nisso quando é algo que não dá dinheiro, que não vai pagar suas contas? Por que fazer isso quando o mercado no Brasil é tão difícil, quando poucas pessoas leem?

Cada escritor tem sua resposta, seus próprios (e vários) motivos. Dificilmente é um só. A maioria vai dizer que é pura necessidade, como respirar, e isso é totalmente verdadeiro.

Mas por que eu escrevo?

Por necessidade, sim. Porque eu gosto, porque me faz bem. Mas ultimamente tenho pensado bastante nisso e acredito que encontrei o principal motivo.

Para ser ouvida.

Quando eu falo, as pessoas (não todas, é claro… mas muitas) não me ouvem. Vocês também já sentiram isso? Não acho que é algo que só acontece comigo, claro, mas acontece muito, e é algo que me atinge, que me magoa. E sempre foi assim.

No começo, quando ainda era criança, achava que era exatamente por causa disso. Oras, eu era apenas uma criança, quem escuta uma criança, quem me escutaria naquela época? Hoje vejo o quanto isso está errado. É preciso escutar os pequenos. Por estarem descobrindo a vida, eles têm as melhores perguntas. Eles ainda não foram contaminados por esse mundo sujo, triste e repleto de preconceito. E seus questionamentos vão fazê-lo questionar a si mesmo. Os adultos não são donos de todas as respostas, afinal.

Quando era adolescente, me calei. Por que falar, se ninguém iria ouvir? Fui uma criança impertinente, que falava demais, perguntava demais. Percebi que isso irritava as outras pessoas e não queria que elas não gostassem de mim. À procura de não me isolar, me isolei ainda mais. Pensava em cada palavra antes que elas deixassem meus lábios. Será que as pessoas ririam do que eu diria? Será que brigariam comigo por eu estar errada? Ou será que simplesmente me ignorariam? Comecei a falar cada vez mais baixo, aos sussurros, até adotar o silêncio como meu melhor amigo. Era melhor assim, mais seguro.

Mas é impossível abafar as palavras que brotam dentro da gente. Você se engasga, vive com um bolo de pensamentos não verbalizados na garganta, sufocando-o. E justo quando você é adolescente descobre que não existem respostas corretas, que todas as perguntas que fazia quando criança não foram suficientemente respondidas, que talvez sequer haja respostas para elas. É quando você descobre o mundo real e toma um choque. Ele não é o mundo colorido que um dia imaginou, mas sim cinza, feio. Você se revolta. Você quer gritar.

Mas como gritar quando não se tem voz?

Escrevendo.

A escrita é, ao mesmo tempo, silenciosa e solitária, barulhenta e rodeada de pessoas. Você está só, mas não sozinho. Você pode estar acompanhado de uma infinidade de personagens em suas histórias. Eles podem ser seus amigos ou inimigos, podem ser sábios ou ignorantes, podem ser felizes ou miseráveis. Todos eles são um pedaço seu, mas, ao mesmo tempo, estão muito longe de serem você. São várias pessoas que você conhece e nenhuma delas. São pessoas que você ainda vai conhecer e pessoas com quem jamais vai se encontrar.

Desde que comecei a ler, me interessei pela escrita. Porém, foi só na adolescência que realmente comecei a levá-la a sério. Às vezes, meus textos eram meus únicos amigos, meu único consolo. Escrevia porque necessitava daquilo, daquelas horas sentada na companhia das minhas próprias histórias, de personagens meus ou emprestados de outros autores. Era ali, em frente à folha em branco, que eu podia ser quem quisesse, como quisesse. Que podia expressar tudo o que pensasse. Falar, não em voz alta, mas ainda assim bem alto.

Gritar.

Eu podia ser eu mesma.

Por anos, não contei a ninguém o que fazia. Era algo só meu. As pessoas na internet, porém, desconhecidos, pessoas sem rosto, mas com alma, sabiam o que eu fazia. Elas me liam. Elas me escutavam. E foi maravilhoso descobrir que isso era possível. Que alguém, em algum lugar, podia me ouvir.

Não consegui mais parar. Mesmo que a vida tenha acontecido, com sua dura realidade, a escrita sempre esteve já. Pulsando. Vibrante. Viva. E percebi, ao longo dos anos, que por mais que tivesse me tornado adulta e vivesse a ilusão de que agora sim minha voz era ouvida, e o peso das responsabilidades já sufocasse meus sonhos, a escrita permanecia, havia palavras dentro de mim que não podiam ser verbalizadas, somente escritas.

Então voltei a escrever. E, mais que isso, escrevia agora minhas próprias histórias, totalmente minhas, com meus próprios personagens, minha imaginação e minhas experiências.

Estou com trinta anos agora. Em alguns aspectos, talvez seja adulta. Em outros, não. Isso também depende dos outros, mas principalmente de mim. Há algumas pessoas que nunca me enxergarão como uma pessoa digna de ser escutada. Talvez, para elas, eu seja sempre uma menina, uma garota, nunca uma mulher. Para outras, o simples fato de ser mulher já é suficiente para que minhas palavras não sejam digas de atenção. Para mim, às vezes sou menina, às vezes garota, às vezes mulher. E sei que todas as minhas vozes merecem ser ouvidas.

Se não forem ouvidas, serão lidas.

Por isso escrevo.

Comments
6 Responses to “Por que você escreve?”
  1. Escrever é um paixão que nasce de dentro para fora. Um prazer indescrevível em tentar alcançar o mais profundo do homem.

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  2. Republicou isso em O LADO ESCURO DA LUAe comentado:
    Ótimo. Franco. Direto

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  3. Francine Estevão disse:

    Adorei a “resposta”. Também acho que escrever nos leva a ser ouvidos. Para mim escrever é um ato que ajuda a ter clareza, quando coloco a “caneta no papel” e começo a tecer ideias, parece que tudo se transforma dentro de e passa a fazer mais sentido.
    Lindo post!

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  4. NaRealShe disse:

    Oi nossa como me identifiquei com seu POST decidir escrever por isso pois sempre fui muito reprimida e hoje já adulta ninguém me ouvidos. Que bom conhecer alguém que pensa como eu obrigada bjs💜💜💜

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  5. vidacomqualidadesite disse:

    Republicou isso em Vida com Qualidade.

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  6. vidacomqualidadesite disse:

    Muito bom o post

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